terça-feira, junho 13, 2006
Dostoievski e a cvilização: A crise do sistema penal
Acabo de ler no recomendável "Dizpositivo", um blog de uma espécie em vias de extinção (juristas mais virtuosos que viciosos ), que os jornais britânicos anunciam graves perturbações no sistema de justiça penal inglesa, com o Governo de Blair a fazer eco de uma misteriosa voz popular que protesta por penas mais musculadas, decisões mais expeditas e palavreado mais pragmático. Do meu ponto de vista, só há uma leitura a fazer: muito maus sinas para aqueles que detestam a opressão e querem mais Estado-de-Direito.
Diz-se que Dostoievski afirmava ser o sistema penal o mlhor indício da maturidade civilizacional de um povo. Eu acrescentaria que o teste decisivo é a resposta da política criminal a uma onda criminógena nefasta, como o terrorismo global ou a criminalidade urbana motivada por perturbações sociais. Nestes casos, muita gente com vistas curtas protesta por um Estado mais forte e muitos Governos em crise vão atrás da conversa. A última vez que a Europa assistiu a estas contingências emocionais, acordou assombrada por regimes que não mostram nenhum respeito pelo invivíduo. O cidadão comum que se queixa no táxi ou na pastelaria que os criminosos andam à solta por causa do palavreado inútil dos magistrados mais conscienciosos esquece-se que amanhã pode acordar num palco kafkiano - caso em que, sem dúvida, se aperceberá do mal que fez, dos erros que cometeu e do efeito da sua negligência verbal.
Sou daqueles para quem é melhor ter 10 criminosos à solta do que 1 inocente encarcerado. Detesto que se brinquem com questões de prova, que se condene sem convicção inabalável e que se invada indiscriminadamente a autonomia das pessoas para obter - ou mesmo forjar - indícios da prática de um crime. Julgo não errar se disser que esta forma de pensar, apesar do contributo eslavo de Dostoievski, começa no lado lá do Canal da Mancha, onde por acidente histórico, mais do que qualquer outra coisa, se levou muito a sério a necessidade de conter entusiasmos políticos no sistema penal. Deus nos livre de perdermos essa referência moral por causa de uma imbecilidade política clamorosa!