quarta-feira, janeiro 31, 2007
Etica
Reproduzo o que escrevi no blogue de Nicolina Cabrita:
Acho extraordiario que declare que "para mim a tortura nunca e opcao" como fundamento para rejeitar o utilitarismo. A tarefa da teoria moral e justamente fundamentar accoes humanas. Por outras palavras, a teoria moral nao procura justificar as suas intuicoes mas conduzi-la a elaborar juizos morais correctos. Se o que e correcto esta ou nao em linha com o que lhe parece correcto e o que so sabemos depois de meter a colher ao pudim... partir da conclusao para a premissa e, para alem de um erro logico (chama-se "non sequitur"), uma rejeicao da teoria moral. Pode entao dizer -- embora tenha de fundametar -- que a teoria moral e irrelevante, ou irrelevante na pratica. (Adorava que dissesse isto porque lhe caia logo em cima :))
Pode perguntar entao: se as minhas intuicoes nao me podem guiar, como e que eu sei o que e um argumento moral correcto. Este e um problema epistemologico muito serio da teoria moral. A minha resposta preferida e a que pode encontrar no primeiro capitulo da Teoria da Justica de John Rawls -- o chamado "equilibrio reflectido". A ideia e partir das intuicoes para a teoria e desta para as intuicoes ate chegar a um ponto de "equilibrio reflectido". Permita-me que lhe diga que o seu equilibrio esta longe de ser reflectido, nao porque lhe faltem as intuicoes mas porque lhe falta testa-las intelectualmente.
Criticar o utilitarismo -- teoria moral que eu rejeito -- porque leva a resultados contra-intuitivos e um mau argumento. Primeiro, porque todas as teorias morais modificam (ou pelo menos testam) a nossa percepcao do que e correcto ou incorrecto, justo ou injusto, bom ou mau. Segundo, porque o utilitarismo e assumidamente contra-intuitivo, o que nao obsta a que seja uma filosofia moral muito respeitavel que pode bem, numa das versoes mais sofisticadas, perturbar as suas intuicoes correntes...
Acho extraordiario que declare que "para mim a tortura nunca e opcao" como fundamento para rejeitar o utilitarismo. A tarefa da teoria moral e justamente fundamentar accoes humanas. Por outras palavras, a teoria moral nao procura justificar as suas intuicoes mas conduzi-la a elaborar juizos morais correctos. Se o que e correcto esta ou nao em linha com o que lhe parece correcto e o que so sabemos depois de meter a colher ao pudim... partir da conclusao para a premissa e, para alem de um erro logico (chama-se "non sequitur"), uma rejeicao da teoria moral. Pode entao dizer -- embora tenha de fundametar -- que a teoria moral e irrelevante, ou irrelevante na pratica. (Adorava que dissesse isto porque lhe caia logo em cima :))
Pode perguntar entao: se as minhas intuicoes nao me podem guiar, como e que eu sei o que e um argumento moral correcto. Este e um problema epistemologico muito serio da teoria moral. A minha resposta preferida e a que pode encontrar no primeiro capitulo da Teoria da Justica de John Rawls -- o chamado "equilibrio reflectido". A ideia e partir das intuicoes para a teoria e desta para as intuicoes ate chegar a um ponto de "equilibrio reflectido". Permita-me que lhe diga que o seu equilibrio esta longe de ser reflectido, nao porque lhe faltem as intuicoes mas porque lhe falta testa-las intelectualmente.
Criticar o utilitarismo -- teoria moral que eu rejeito -- porque leva a resultados contra-intuitivos e um mau argumento. Primeiro, porque todas as teorias morais modificam (ou pelo menos testam) a nossa percepcao do que e correcto ou incorrecto, justo ou injusto, bom ou mau. Segundo, porque o utilitarismo e assumidamente contra-intuitivo, o que nao obsta a que seja uma filosofia moral muito respeitavel que pode bem, numa das versoes mais sofisticadas, perturbar as suas intuicoes correntes...
segunda-feira, janeiro 29, 2007
Pensamento neoliberal e Justiça
É curioso que o pensamento liberal português quando chega à Justiça no fundo não se distingue do velho corporativismo tão desconfiado que sempre foi do poder judicial. No modelo que sempre se usa para fustigar o socialismo português as excepções são competência do poder judicial e não do legislador. E a morosidade e ineficácia não são exógenas ao modelo.
Justiça e Economia (V)
Continuando a troca de impressões com o Ângulo Recto e a Dra. Nicolina Cabrita. Concordamos que discordamos (o que nem sempre é fácil). Concordamos que a Justiça deve estar baseada em principios éticos discordamos dos principios éticos que devem nortear a Justiça.
A questão da Economia é lateral a tudo isto. A Justiça não deve ser um travão ao desenvolvimento económico como não deve ser um travão ao desenvolvimento social, cultural, demográfico, humano. Mas a Justiça não existe para servir estes desenvolvimentos. Isto é, a Justiça não deve ser pensada nem organizada em função da Economia até porque o que é a Economia é abstracto. A Economia não são os interesses económicos organizados, a Economia não são as empresas e os investidores (ainda que estes são uma parte importante da Economia), a Economia não é o mercado (ainda que este seja um mecanismo de organização social muito importante), etc. E mais não seja, do ponto de vista do crescimento económico, não é claro que desenho institucional deveria ter a Justiça. E não podemos esperar que a Economia se decida para fazer reformas...
A questão da Economia é lateral a tudo isto. A Justiça não deve ser um travão ao desenvolvimento económico como não deve ser um travão ao desenvolvimento social, cultural, demográfico, humano. Mas a Justiça não existe para servir estes desenvolvimentos. Isto é, a Justiça não deve ser pensada nem organizada em função da Economia até porque o que é a Economia é abstracto. A Economia não são os interesses económicos organizados, a Economia não são as empresas e os investidores (ainda que estes são uma parte importante da Economia), a Economia não é o mercado (ainda que este seja um mecanismo de organização social muito importante), etc. E mais não seja, do ponto de vista do crescimento económico, não é claro que desenho institucional deveria ter a Justiça. E não podemos esperar que a Economia se decida para fazer reformas...
terça-feira, janeiro 23, 2007
Populismo ou confusão?
Que grande confusão entre os mecanismos formais de aprovação das leis e quem faz as leis, entre drafting e passing a law. Como se a produção legislativa não pudesse ser tutelada por um conjunto de senhores que não representam a sociedade. Como se não existisse captura do interesse público por interesse privados. Aqui como em qualquer outro país.
sábado, janeiro 20, 2007
Justiça e Economia (IV)
Em polémica com o Ângulo Recto, confesso que não interpretei correctamente os posts anteriores. Estamos pois em concordância quanto à necessidade de mudar alguma coisa.
Contudo existe alguma divergência sobre o que significa um novo paradigma. É que na minha perspectiva Justiça e Economia refere-se à importância da Justiça para a Economia e não a Economia como paradigma da Justiça (como aliás já escrevi em várias ocasiões). Mal seria se a Economia fosse o paradigma da Justiça (emigrava logo de tal sociedade). Dito isto, o cerne é qual deve ser o pensamento ético e moral que deve nortear a Justiça. Nisso sou um utilitarista ainda que numa versão não excluente (a versão utilitarista excluente tem o seu expoente em Richard Posner). Recuso concepções moralmente superiores impostas por entes iluminados sem qualquer conexão com o valor social que possam ter e que são a base do actual pensamente jurídico português.
Apenas um pequeno apontamento. Pessoalmente não são favorável à expansão dos sistemas de mediação em detrimento da mais que apropriada judicialização, como já escrevi, e remando contra a maré. Todo este processo de dejudicialização vai-nos impor sérios custos a médio prazo porque estamos essencialmente a substituir mecanismos de controle ex ante sem criar os adequados sistemas de controle ex post que existem nos países onde a mediação vingou. Por algo será que a mediação cível e penal em França, Itália e Espanha não pega nem com cuspo...
Contudo existe alguma divergência sobre o que significa um novo paradigma. É que na minha perspectiva Justiça e Economia refere-se à importância da Justiça para a Economia e não a Economia como paradigma da Justiça (como aliás já escrevi em várias ocasiões). Mal seria se a Economia fosse o paradigma da Justiça (emigrava logo de tal sociedade). Dito isto, o cerne é qual deve ser o pensamento ético e moral que deve nortear a Justiça. Nisso sou um utilitarista ainda que numa versão não excluente (a versão utilitarista excluente tem o seu expoente em Richard Posner). Recuso concepções moralmente superiores impostas por entes iluminados sem qualquer conexão com o valor social que possam ter e que são a base do actual pensamente jurídico português.
Apenas um pequeno apontamento. Pessoalmente não são favorável à expansão dos sistemas de mediação em detrimento da mais que apropriada judicialização, como já escrevi, e remando contra a maré. Todo este processo de dejudicialização vai-nos impor sérios custos a médio prazo porque estamos essencialmente a substituir mecanismos de controle ex ante sem criar os adequados sistemas de controle ex post que existem nos países onde a mediação vingou. Por algo será que a mediação cível e penal em França, Itália e Espanha não pega nem com cuspo...
Três Apontamentos sobre o Caso Esmeralda
1. Mais uma vez o que sai na comunicação social é uma versão muito particular dos acontecimentos.
2. O legislador português nunca confiou no magistrados. Por isso passou os últimos 100 anos a funcionalizar o poder judicial de forma a que sejam meros funcionários que aplicam a lei com o mais mínimo grau de liberdade na interpretação. Porém quando a aplicação da lei é socialmente polémica, o legislador não aparece (essa entidade sem rosto que nos governa e nos limita de forma quotidiana) e a responsabilidade aos olhos da sociedade cai no magistrado; o que está errado em todo este caso é possivelmente muito mais responsabilidade do legislador errático do que dos magistrados.
3. Insiste-se na lógica do “jurídico e humano” ou do “jurídico e social.” É o vício da dogmática jurídica e do pensamento teleológico. O jurídico só pode ser humano e social. E se não é, então não pode ser jurídico. A lei existe para servir a sociedade e não o contrário. E se a sociedade não se revê na lei e na sua aplicação, então a lei está errada. A ideia de que a lei é produzida por uns iluminados com altos valores e padrões morais a que os demais se têm de sujeitar é uma patranha do nosso pensamento jurídico que nos custou muito. A lei é regulação social, nem mais nem menos. Não podemos permitir que um conjunto de sujeitos ande por aí a regular a sociedade em nome de quaisquer valores superiores que não resultam da vontade manifesta da comunidade regulada.
2. O legislador português nunca confiou no magistrados. Por isso passou os últimos 100 anos a funcionalizar o poder judicial de forma a que sejam meros funcionários que aplicam a lei com o mais mínimo grau de liberdade na interpretação. Porém quando a aplicação da lei é socialmente polémica, o legislador não aparece (essa entidade sem rosto que nos governa e nos limita de forma quotidiana) e a responsabilidade aos olhos da sociedade cai no magistrado; o que está errado em todo este caso é possivelmente muito mais responsabilidade do legislador errático do que dos magistrados.
3. Insiste-se na lógica do “jurídico e humano” ou do “jurídico e social.” É o vício da dogmática jurídica e do pensamento teleológico. O jurídico só pode ser humano e social. E se não é, então não pode ser jurídico. A lei existe para servir a sociedade e não o contrário. E se a sociedade não se revê na lei e na sua aplicação, então a lei está errada. A ideia de que a lei é produzida por uns iluminados com altos valores e padrões morais a que os demais se têm de sujeitar é uma patranha do nosso pensamento jurídico que nos custou muito. A lei é regulação social, nem mais nem menos. Não podemos permitir que um conjunto de sujeitos ande por aí a regular a sociedade em nome de quaisquer valores superiores que não resultam da vontade manifesta da comunidade regulada.
sábado, janeiro 13, 2007
Justiça e Economia (III)
Muitos não estão de acordo com a necessidade de alterar o paradigma da Justiça. Levará tempo mas ele chegará como chegou na Economia, e depois na Educação e na Saúde... porque isso mesmo é a globalização. O resto é o preço que temos de pagar por chegar sempre tarde aonde já chegaram os outros...
Entrevista do MJ ao Expresso
Entrevista ao MJ no Expresso de hoje. Infelizmente, e mais uma vez deixando muito evidente a medíocre qualidade de quem entrevista (assinam Ana Abrunhosa e Nuno Saraiva), o Ministro perde metade da entrevista com o acessório, o fulanismo no combate à corrupção, o caso Casa Pia, e a poliquice (remodelação, escolha do PGR, etc.). No fundamental, as reformas em curso, o Ministro responde bem, sem novidades; os entrevistadores são incapazes de recorrer a uma estatística ou a experiências comparadas para realmente colocar um questão substantiva ao Miinistro. Naquilo que mais me interessa, o paradigma, a ideologia, a filosofia subjacente, o modelo, nada de nada. Infelizmente limita-se o Ministro a elogiar o reformismo cavaquista e diz o Expresso que o Ministro se inspira no ímpeto reformista do Governo Cavaco. Eu fico na dúvida pois na Justiça a última palavra que pode caracterizar o Governo Cavaco na Justiça (principalmente Fernando Nogueira e Laborinho Lúcio) é reformista. Foi sim anti-reformista, super-formalista e verdadeiramente imobilista. Todos os problemas corporativos foram agravados na década do Governo Cavaco sem qualquer contrapartida significativa. E foi incapaz de acompanhar o movimento reformista que se fazia já sentir noutros países. Mais que não seja porque o próprio economista Cavaco é daqueles que defendeu sempre a supremacia da macro sobre a micro e nunca prestou atenção às instituições. Fico pois sem entender o que pretende dizer o Ministro...
Grandes Reformistas (V)
O 3o Conde de Castelo Melhor (1636-1720), Luis de Vasconcelos e Sousa, militar e político, nunca saberemos qual o alcance do seu projecto de reformas para a corrupta e decadente corte portuguesa do final do séc. XVII. Se era um mero arribista ou um verdadeiro reformador é um incógnita, mas que incomodou muito os interesses instalados não há dúvida. Um golpe de estado, intriga de alcova e a usurpação do trono foram as soluções encontradas pelo establishment para minimizar as mudanças em curso. Emigrou para Londres onde era mais apreciado.
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sexta-feira, janeiro 12, 2007
Grandes Reformistas (IV)
O Conde-Duque de Olivares (1587-1645), último grande reformista da corte filipina. Mal-amado e odiado pela história tanto portuguesa como castelhana, veria as suas reformas económicas e fiscais implementadas mais de cem anos após a sua morte, mas as suas reformas políticas sobre a viabilidade do Reino de Espanha são hoje o cerne da vida política actual. Incompreendido pelo establishment e abandonado pela monarquia por quem tanto fez, morreu só e difamado.
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sábado, janeiro 06, 2007
Editorial do DN
Aqui fica o editorial do DN de hoje. Falamos a mesma linguagem.
quinta-feira, janeiro 04, 2007
Grandes Reformistas (III)
Rui Gomes da Silva (1516-1573), Duque de Pastrana e Principe de Éboli, português de gema, grande de Espanha e um dos homens mais influentes do governo de Filipe II de Espanha, casado com Ana de Mendoza y La Cerda. Foi o líder do partido «pacifista» da corte filipina quando era possível defender os centros de decisão nacional fora de Lisboa. Totalmente ignorado pelos seus compatriotas e pela história patrioteira.
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Novo blog jurídico
A acompanhar com interesse, In Verbis.
quarta-feira, janeiro 03, 2007
Grandes Reformistas (II)
Outro dos tais reformistas que teve um final menos feliz. O establishment estava demasiado instalado para permitir as grandes reformas que preconizava D. João II. Foi substituído pelo seu primo, um homem do establishment.
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segunda-feira, janeiro 01, 2007
Grandes Reformistas (I)
Dom Pedro, Duque de Coimbra (1392-1449), vilmente morto em Alfarrobeira às mãos do establishment. Era um estrangeirado, um homem da cultura das sete partidas... Vingaram os seus irmãos, o Duque de Bragança e o Infante D. Henrique, bons exemplos da mediocridade reinante, dos interesses instalados e da corrupção que lhes comprou os laudos e os rezos da História patrioteira.
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